23/04/2019 20h39 - Atualizado 23/04/2019 20h39
Palestra- Provimento 63 do CNJ e reconhecimento de parentalidade
Por Terezinha
para IARGS
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O Grupo de Estudos em Direito de Família do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul apresentou hoje, dia 23/04, a palestra da advogada Simone Tassinari que, de forma didática e concisa, explanou sobre o tema “Provimento 63 do CNJ e reconhecimento de parentalidade”. Trata-se de um assunto que, segunda ela, mais recebeu alterações em face do reconhecimento da socioafetividade como elemento de possibilidade de criação e vínculo parental a ser reconhecido extrajudicialmenre. A advogada foi recepcionada pela diretora do instituto, Ana Lúcia Piccoli.
A palestrante esclareceu sobre a possibilidade jurídica do reconhecimento de múltiplos vínculos parentais, a partir do julgado da Repercussão Geral 622 no Supremo Tribunal Federal, no qual atuou como advogada do IBDFAM, na condição de amigo da Corte (Recurso Extraordinário nº 898.060), e do recente provimento 63 do Conselho Nacional de Justiça, que assegurou a possibilidade do reconhecimento extrajudicial voluntário de parentalidade socioafetiva perante os registros civil, sem necessidade, portanto, de ação judicial.
Este provimento administrativo, informou, assegurou um avanço significativo às famílias que necessitavam deste reconhecimento e, por esta razão, talvez, possa ter provocado tantos rumores entre os juristas contra e a favor.
Dentre as alterações na seara da paternidade e da maternidade, a Dra Simone destacou o Reconhecimento Judicial de Filiação socioafetiva, de acordo com o Código Civil de 2002 (artigo 1.593): “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.
Referiu, também, a disputa entre a paternidade biológica e a socioafetiva – Repercussão Geral 622: “embora a parentalidade socioafetiva já estivesse consolidada na jurisprudência pátria, ainda pendia dúvida com relação a qual das parentalidades deveria preponderar em caso de disputa entre elas. Seria a biológica ou socioafetiva”. Segundo a advogada, este foi o norte que conduziu o julgamento do Recurso Extraordinário nº 898.060, do qual se extraiu a tese de repercussão geral “622 – Prevalência da paternidade socioafetiva em detrimento da paternidade biológica.”.
Ao final do julgamento, mencionou, fixou-se, por maioria, o seguinte entendimento: “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.
Em relação ao Provimento 63 e as possibilidades de reconhecimento extrajudicial da parentalidade vivida, a advogada informou que, até a decisão do STF, as demandas que buscassem reconhecimento de filiação socioafetiva deveriam ser propostas perante o Poder Judiciário. Na sua avaliação, a grande inovação do Provimento 63 foi a possibilidade de fazê-lo administrativamente, perante qualquer registro civil das pessoas naturais – desvinculando o ato do registro de nascimento daquele ser.
Tal requerimento, explicou, deve atender simultaneamente a um conjunto de formalidades expressas: o requerente deve ser maior de 18 anos (independente do estado civil); não pode ser ascendente ou irmão do pretenso filho; e a diferença de idade entre o requerente e o filho tem que ser igual ou maior que 16 anos 24. Além disso, informou que o requerimento pode ser realizado em localidade diversa de onde foi lavrada a certidão de nascimento.
Ela atentou, todavia, que deve haver consentimento expresso e pessoal da mãe e do pai e, caso o filho for maior de 12 anos, também será necessária a sua autorização. Ainda, dentre as formalidades, citou a coleta pessoal das assinaturas e a realização de uma declaração das partes de desconhecimento de discussão judicial à filiação.
Advertiu, contudo, que sob hipótese alguma, o provimento destina-se a legitimar qualquer ato de uma paternidade ou maternidade socioafetiva ainda não consolidada. “Um dos pressupostos da norma é a regularização de situação de fato já ocorrida, logo, já devem estar presentes – antes do momento de chegada ao registro – todos os requisitos referentes à posse do estado de filiação.
A advogada também salientou que não se poderá fazer uma adoção via reconhecimento de maternidade ou paternidade socioafetiva. “Tratam-se de institutos autônomos e distintos. Este reconhecimento extrajudicial serve para reconhecimento de situações fáticas já existentes e não para a inicial criação de vínculos de parentalidade”, acentuou, acrescentando que, caso ocorra de forma consensual, pode ser feito administrativamente e, se litigiosa, há necessidade de pronunciamento judicial.
Pela jurisprudência consolidada no país, a Dra Simone alertou sobre a possibilidade de reconhecimento de mais de uma filiação, com origens distintas. Segundo ela, este parecia ser o mote que o Provimento 63, uma vez que exigiu a anuência da mãe e do pai e explicitamente no artigo 14 do Provimento: “o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o registro de mais de dois pais e de duas mães no campo filiação no assento de nascimento”.
Embora a multiparentalidade possa ser reconhecida administrativamente, a Dra Simone Tassinari lembrou, contudo, sobre a impossibilidade de dois pais ou mães pretenderem, no mesmo procedimento, o reconhecimento. Mesmo diante disso, advertiu que ainda persiste a noção de que é possível o reconhecimento de multiparentalidade via Provimento 63 do CNJ.
Referente aos efeitos decorrentes do reconhecimento extrajudicial, a advogada salientou que são admitidos todos os direitos e deveres decorrentes das relações de parentesco, proibidas quaisquer designações discriminatórias, a exemplo do nome; da solidariedade familiar; dos direitos sucessórios; dos atributos referentes ao poder familiar; do dever de sustento; da guarda e educação, dentre outros. “Não há distinção se a relação é multiparental ou não”, frisou.
Neste ponto, referiu, há maior vantagem referente às crianças e adolescentes em contar com mais alguém para os cuidados e exercícios parentais. Entretanto, entende que, muitas vezes, é esquecida a reciprocidade existente entre pais/mães e filhos, e que este filho, que hoje conta com quatro pais, levará quatro idosos em sua vida adulta para amparar. “A parentalidade vem por completo, com seus ônus e bônus”, afirmou.
Para finalizar, a advogada afirmou que paternidade e maternidade socioafetivas, sejam elas multiparentais ou não, não são e nem podem ser “monstrengos” dos desejos filiais, ao contrário. No seu entender, o vínculo de parentalidade envolve responsabilidade bilateral, compromisso e comprometimento para o resto da vida e, quiçá, de realização dos desejos do pós-morte.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa