04/08/2015 15h59 - Atualizado 23/05/2017 12h50
Palestra- Mitos e verdades na Guarda Compartilhada
Por Terezinha
para IARGS
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Na reunião do Grupo de Estudos de Direito de Família ocorrida hoje, dia 04/08, a advogada Liane Bestetti palestrou sobre o tema “Mitos e Verdades na Guarda Compartilhada”, no quarto andar do IARGS. O encontro foi aberto pela Dra Helena Ibañez que há 40 anos coordena o grupo.
Para iniciar, a Dra Liane lembrou que a guarda compartilhada passou a figurar no ordenamento jurídico brasileiro a partir da vigência da Lei nº 11.698, de 13/06/2008, que dispôs que “sempre que possível” a guarda deveria ser partilhada, atribuindo ao juiz a faculdade de concedê-la ou não, valendo-se, para tanto, das circunstâncias no caso concreto.
Naquela ocasião, explicou que a intenção do legislador era de acabar com a presunção de que apenas um dos genitores era apto a deter a guarda dos filhos (normalmente a mãe) após a separação ou divórcio. Recentemente e na mesma direção, esclareceu que a Lei nº 13.058, de 22/12/2014 alterou novamente o Código Civil, determinando a prevalência da guarda compartilhada sobre a unilateral.
Nos termos da lei, a guarda compartilhada consiste na “responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns”. (Art. 1583). No entendimento da Dra Liane, então, os direitos e deveres inerentes ao poder familiar, exercidos por meio da guarda, não deveriam se romper com o fim do vínculo conjugal. “A guarda compartilha em nada tem a ver com o poder familiar”, acentuou.
Conforme explicou, se durante o casamento ou união estável o casal era igualmente apto a exercer a guarda dos filhos, após a separação ou divórcio, tal situação não se altera, com a exceção de fatos excepcionais que deverão ser comprovados. Entretanto, em se tratando de mudança de um paradigma, entende que existem resistências e posições distintas na forma e interpretação da nova lei.
Segundo a advogada, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, “reconhecido e aclamado nacionalmente como o mais visionário dos Tribunais pátrios em se tratando de julgamentos de questões ligadas ao Direito de Família”, se mostra cauteloso na aplicação direta da nova Lei, ou seja, as circunstâncias do caso concreto ainda detêm relevância para a concessão ou não da guarda compartilhada.
“Mesmo que a Lei determine, sem condicionamentos, que o exercício da guarda se dê por ambos os genitores, se o melhor interesse do menor continuará sendo primordial para a concessão ou não da guarda compartilhada, valerá o exercício pleno do poder jurisdicional”, destacou.
Por outro lado, referiu a posição do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp 1251000/MG, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, com a demonstração de que caminha em consonância com o espírito do instituto da guarda compartilhada. Para a ministra, informou, o compartilhamento da guarda deve ser a regra geral, porque é “o ideal a ser buscado no exercício do poder familiar entre pais separados, ainda que sejam necessárias reestruturações, mudanças, concessões, diversas adequações. Tudo para que os filhos possam manter um convívio familiar harmonioso com ambos, com duplo referencial”.
Distinguiu que a nova Lei, por sua vez, estabelece que “quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor”, ou seja: a guarda compartilhada passa a ser regra, não faculdade, uma imposição legal e, talvez, nesse ponto, entende ser a questão mais polêmica do instituto.
De um lado, informou, há os que defendem que tal imposição, mesmo quando não houver consenso entre os pais, seria uma porta aberta para o diálogo e a minimização dos conflitos; de outro, aqueles que afirmam que o dissenso se mostra prejudicial aos filhos mostrando-se como elemento suficiente ao não compartilhamento da guarda.
Segundo a Dra Liane Bestetti, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento acima referido, entendia ser dispensável o consenso entre os pais, porque “o Poder Familiar existe para a proteção da prole, e pelos interesses dessa é exercido, não podendo, assim, ser usado para contrariar esses mesmos interesses. (…) Exigir-se consenso para a guarda compartilhada dá foco distorcido à problemática, pois se centra na existência de litígio e se ignora a busca do melhor interesse do menor”.
“Nessa linha, eventual litigiosidade entre os pais pode e deve ser solucionada de forma a viabilizar a concessão da guarda compartilhada, inclusive com abordagem interdisciplinar, o que significa dizer que o juiz passa a ter maior responsabilidade nessas situações, eis que, sensível à causa, poderá (e deverá) aplicar as medidas que entender adequadas ao caso concreto, justamente para que o clima belicoso entre os pais seja reduzido ou até mesmo encerrado”, evidenciou.
No artigo da nova Lei “Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos” (art. 1.583, § 2º), a advogada entende que acaba por gerar interpretações equivocadas, na medida em que parece somar guarda com posse, ou confundir guarda compartilhada com guarda alternada.
Ao contrário do que pode parecer, a Dra Liane enfatizou que não se trata de mera alternância de residência (uma semana com a mãe, outra semana com o pai), tampouco de guarda alternada, uma vez que guarda alternada é aquela em que cada um dos pais exerce exclusivamente a guarda dos filhos, por um determinado período de tempo, com a sua custódia física.
“Na guarda compartilhada a guarda é exercida por ambos os pais, igualmente, independente de estarem na custódia física do filho, e não atrai, por si só, qualquer pretensa equivalência de tempo de convívio dos filhos com os genitores”, frisou. Na sua avaliação, trata-se do exercício efetivo do poder familiar pelo pai e pela mãe, de forma igualitária, mesmo após o rompimento do vínculo conjugal, visando sempre ao bom desenvolvimento dos filhos que permanecerão com a referência dupla, “tão importante para a sua formação”.
Para finalizar, assinalou que um impositivo legal não terá o condão de fazer nascer a maturidade emocional tão indispensável ao ato de criar filhos, alterar personalidades e nem apagar do íntimo dos genitores as razões e os conflitos que culminaram com a separação do casal.
“Sempre se fará necessário, na ausência de consenso, o discernimento judicial para impor os limites à arrogância e ao maniqueísmo de genitores que hierarquizam seus desejos, às vezes pouco nobres, dando-lhes maior relevância do que ao amor que tanto apregoam sentirem por seus filhos”, concluiu, destacando que “o pleno exercício da guarda compartilhada requer pais adultos, com o olhar no outro (o filho) e isto, por certo não está ao alcance da Lei, mesmo que seja a lei do afeto”.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa