27/08/2019 23h19 - Atualizado 27/08/2019 23h19
Palestra- A questão da valorização das cotas na partilha de bens – posição dos Tribunais
Por Terezinha
para IARGS
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A advogada Rafaela Rojas Barros estreou no Grupo de Estudos de Direito de Família do IARGS, hoje, dia 27/08, com a palestra “A questão da valorização das cotas na partilha de bens – posição dos Tribunais”, sendo recepcionada pela diretora-adjunta do Grupo, Dra Ana Lúcia Piccoli.
Destacou, inicialmente, a necessidade do Direito de Família e Sucessões buscar o auxílio de outros ramos do Direito, a exemplo do Direito Empresarial, para se chegar à solução de inúmeros conflitos. A preleção foi seguida de grande debate entre os presentes.
Ela lembrou a origem de uma cultura patriarcal em que vigorava a concepção de casamento indissolúvel, sem qualquer previsão de partilha de bens em um contexto de ruptura no ordenamento jurídico. “Hoje, a nossa sociedade se caracteriza pela conformação de famílias eudemonistas, centradas na busca da satisfação pessoal dos seus membros, independentemente de estarem juntos ou não”, explicou.
A partir de meados dos anos 1970, disse, com os movimentos voltados à facilitação do divórcio, que acabou sendo possível ocorrer na sua forma direta em 2010, com a promulgação da Emenda Constitucional nº. 66, os divórcios e as dúvidas que permeavam o momento da partilha de bens de um casal, tomaram um vulto expressivo. “Nesse sentido, o tema das cotas sociais, bem como o de sua valorização, vieram à tona, exigindo do profissional do Direito lidar com a necessidade de correlacionar as normas de Direito de Família e de Direito Societário”, esclareceu.
A Dra Rafaela explicou que a escolha do regime de bens é decisiva no tocante à futura divisão das cotas e/ou valorização de sociedade. Segundo ela, a contribuição ou promessa de contribuição de aporte para a criação da sociedade, confere ao sócio direitos e obrigações: “a análise do regime de bens, assim como a averiguação de pré-existência ou não de empresa ao casamento ou união estável e seu objeto/natureza, será essencial para definir se haverá ou não partilha da valorização das cotas societárias”.
A advogada lembrou que o capital social é dividido em cotas (iguais ou desiguais), cabendo uma ou diversas a cada sócio. “Todo sócio que aporta capital é detentor de cotas e, portanto, de direitos e obrigações”, afirmou, acrescentando que o capital social da empresa pode ser formado por dinheiro, bens ou direitos.
No âmbito societário, referiu que a empresa passa a ter a necessidade de examinar a questão da meação do cônjuge do sócio, implicando que tome medidas acautelatórias ou preventivas já no contrato social.
Levando em consideração a mais recente jurisprudência no sentido da incomunicabilidade da valorização das cotas sociais quando estas forem exclusivas do sócio, explanou que a questão que surge no âmbito de Direito de Família é a de que o lucro que tal sócio vier a receber da distribuição de resultados da sociedade entra em seu patrimônio e, portanto, dependendo do regime de bens, é considerado patrimônio comum. No entanto, advertiu que o lucro que não é distribuído e é reinvestido na sociedade, pode ser convertido em aumento de capital social e, consequentemente, em aumento e valorização da cota.
Diante disso, destacou diferentes situações: quando a atividade empresarial do cônjuge é o seu próprio trabalho (as cotas societárias têm caráter de provento do trabalho pessoal); e quando as cotas sociais não têm relação com a atividade laborativa do divorciando (mero investimento).
Nesse sentido, a fim de preservar a meação do cônjuge que não participa da pessoa jurídica em questão, bem como resguardar os interesses da empresa, que tem outros sujeitos envolvidos, esclareceu que se impõe uma aplicação correta das normas do Direito Empresarial, juntamente com as considerações acerca do regime de bens escolhido pelo casal.
Tratando-se de sociedades limitadas, preveniu que as cotas sociais pertencentes a um dos cônjuges não são partilháveis em si, logo, indivisíveis, sendo devido, todavia, o repasse ao cônjuge não sócio da quantia equivalente à metade do valor apurado, se adquiridas na constância do relacionamento, ou, se adquiridas posteriormente, à metade do valor equivalente à valorização das cotas implementada durante o matrimônio ou união.
Em relação à valorização das cotas propriamente dita, levou em consideração os critérios utilizados pelo TJRS para determinar se há ou não partilha da valorização que as cotas sociais experimentam. Como exemplos citou os seguintes julgados às Apelações Cíveis: 70030742258, 70032665804, 7005667846 e 7006603879.
De acordo com a advogada, o TJRS distingue com precisão esses casos, a exemplo de julgado proveniente da Oitava Câmara Cível – Apelação Cível nº. 70052568110, que entendeu pela não comunicabilidade, incluindo tanto as cotas quanto sua eventual valorização (adotado o regime da comunhão parcial de bens e comprovado o aumento de capital das cotas na constância da união).
Por outro lado, citou o julgamento da Apelação Cível nº 70051423192/2013, datado de 2013, ao definir que a valorização, no caso, fora fruto adquirido na constância do casamento, ou seja, que o acréscimo da participação societária assumira caráter de bem adquirido onerosamente na constância do casamento, sendo lícita a partilha da valorização.
Relacionado ao termo inicial de constituição da sociedade – marco inicial da união, informou que o TJRS decidiu que o fato de a participação societária ter ocorrido antes do casamento, não seria fundamento suficiente para reconhecer a exclusividade sobre a valorização das cotas (AI 70023972649 (2008) e AC 70035907104 (2010), ambos da 8ª Câmara Cível e da lavra do Desembargador Rui Portanova.
Tais decisões, observou, são anteriores ao “paradigmático” precedente da lavra do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, sendo alvo de “fortes críticas” (STJ – Resp. 1173931, Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino – 22/10/2013 –Terceira Turma).
Sendo assim, justitifocu que a decisão do STJ redundou no entendimento hoje majoritário do TJRS, de que a valorização patrimonial das cotas sociais de sociedades, adquiridas antes do início do período de convivência, decorrem de mero fenômeno econômico, e não do esforço comum do casal e, desse modo, não se comunicam.
Embora a temática em questão seja controversa, a Dra Rafaela salientou que a grande maioria das decisões posteriores do TJRS acompanhou o entendimento do STJ, no sentido de que o crescimento do patrimônio societário, sua valorização ou desvalorização, são aspectos próprios do negócio, “sendo questão intrínseca à atividade econômica desenvolvida, com maior ou menor êxito, pela empresa como um ente em si, ou seja, ou em benefício da pessoa jurídica ou em seu prejuízo”.
Dessa forma, a advogada entende que a valorização de cotas sociais, adquiridas antes da união estável ou do casamento, são de propriedade exclusiva do detentor originário e, portanto, não partilháveis”. Para concluir, disse que a discussão acerca da natureza da valorização (ou fruto ou instrumento de trabalho) encontra-se, momentaneamente, superada, substituída pela corrente majoritária que defende ser a valorização das cotas um aspecto do próprio negócio: “pouco importa se a participação societária é um investimento ou o próprio trabalho do detentor das cotas sociais; a valorização das cotas sociais é vista, tão somente, como um fenômeno econômico e, portanto, independentemente do esforço comum das partes”.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa