26/08/2025 11h31 - Atualizado 26/08/2025 11h31

Núcleo de Debates entre Direito e Literatura promove encontro sobre Admirável Mundo Novo

Por Terezinha
para IARGS

O Núcleo de Debates entre Direito e Literatura, promovido pelo Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS) em parceria com a Faculdade de Direito da UFRGS, realizou, no dia 25 de agosto, no Pantheon da Faculdade, mais uma edição de seus encontros. Nesta edição, a obra escolhida foi o clássico Admirável Mundo Novo (1932), de Aldous Huxley. O encontro foi transmitido ao vivo para o Canal do YouTube do IARGS.

O evento contou com a presença da presidente do IARGS, Sulamita Santos Cabral; da diretora da Faculdade de Direito da UFRGS, Ana Paula Motta Costa; do coordenador do Núcleo, César Vergara de Almeida Martins Costa, vice-presidente do IARGS; da professora convidada Maria do Carmo Campos, doutora em Literatura Brasileira pela USP; e dos advogados Laura Levy e Roberto Saraiva como debatedores.

Prestigiaram ainda a solenidade a vice-presidente do IARGS, Liane Bestetti, e os diretores-secretários Ana Amélia Zanella Prates e Roberto Medaglia Marroni Neto, além de associados do IARGS, professores e alunos.

Abertura

A Dra. Sulamita Santos Cabral saudou todos os componentes da mesa e os presentes, destacando que cada evento que comparece na Faculdade de Direito da UFRGS lhe provoca grande emoção. Ela agradeceu a “importante parceria” da Faculdade com o IARGS e reconheceu a contribuição de cada participante para o sucesso do encontro.

Na sequência, a diretora Ana Paula Motta Costa também saudou os presentes e destacou que a Dra. Sulamita Santos Cabral foi a primeira professora mulher concursada na Faculdade de Direito da UFRGS. Ela afirmou ser uma honra sediar, em conjunto com o IARGS, os encontros do Núcleo de Debates entre Direito e Literatura, ressaltando a importância da reflexão que une essas áreas do conhecimento. “Há uma interseção grande entre Direito e Literatura: de um lado, a literatura como expressão cultural; de outro, o Direito, produto cultural que regula as ações da sociedade e estabelece padrões de convivência”, afirmou.

Logo após, o coordenador do Núcleo de Debates entre Direito e Literatura, César Vergara de Almeida Martins Costa, fez a apresentação da convidada e conduziu o debate, mediando as reflexões e discussões entre os participantes.

Durante a apresentação, a professora Maria do Carmo Campos destacou como Aldous Huxley, em Admirável Mundo Novo (1932), antecipou invenções e questões sociais que só se concretizariam décadas depois. Ela informou que na obra, composta por 18 capítulos, já apareciam referências à televisão e ao helicóptero, tecnologias que ainda estavam em fase embrionária. “Huxley combina dados históricos, percepções filosóficas, religiosas e científicas com a ficção, criando uma narrativa que projeta um modelo civilizatório dominador, onde história, invenção e ficção se entrelaçam”, explicou.

A professora também ressaltou os aspectos importantes da obra, como o condicionamento social, a hierarquia rígida de castas e os mecanismos de controle, como a hipnopédia e o uso de medicamentos que anulavam a reflexão individual. Para Maria do Carmo, o livro permanece como um alerta atual, evidenciando a literatura como um “espaço ilimitado, capaz de dialogar com Shakespeare e, ao mesmo tempo, revelar os riscos de uma sociedade controlada por regras, preconceitos e tecnologia”.

Debatedores

A diretora do Departamento de Direito e Bioética do IARGS, advogada Laura Levy, destacou como tema central da obra “Admirável Mundo Novo” a reprodução humana de maneira artificial. Para ela, esse aspecto dialoga diretamente com a bioética, “que mantém como preocupação ética permanente os limites da intervenção tecnológica sobre a vida”.

Laura lembrou que a obra de Aldous Huxley suscita reflexões sobre eugenia, transumanismo, medicina de precisão, automação humana e a formatação do indivíduo, questões, segundo ela, cada vez mais atuais. Como exemplos, citou a recente notícia da criação de um robô na China capaz de gestar e dar à luz, bem como a tendência, no Vale do Silício, de bilionários buscarem gerar bebês “mais inteligentes” por meio de testes genéticos em embriões ou pela escolha estratégica de parceiros.

Para concluir, destacou que, por meio da perspectiva do biodireito e da bioética, o livro abre espaço para um debate amplo sobre os impactos da ciência e da tecnologia na vida humana e na sociedade contemporânea.

O advogado Roberto Saraiva destacou que a crítica à ciência e à inovação, presente em Admirável Mundo Novo, deve ser entendida com cautela. Para ele, a tecnologia é parte da natureza humana e essencial ao progresso civilizacional, desde que utilizada de forma ética e em prol do bem-estar social. Também chamou atenção para a “adultização” das crianças retratada na obra, reforçando a importância de respeitar as fases do desenvolvimento infantil. Por fim, analisou o ritual coletivo descrito no livro como uma metáfora da utilização da religião e de sistemas de valores pelas elites como instrumento de controle social. Ele ressaltou, no entanto, que essa crítica não deve ser entendida como sugestão de supressão da espiritualidade, já que a religião, assim como a arte e a literatura, constitui parte intrínseca da expressão e da experiência humana.

Em sua fala, o Dr. César Vergara de Almeida Martins Costa destacou que a obra em debate descreve uma sociedade rigidamente controlada, na qual seres humanos são produzidos em laboratório e condicionados desde o nascimento para ocupar funções pré-determinadas, “em uma rígida divisão de classes”.

De acordo com sua explanação, o lema “Comunidade, Identidade, Estabilidade” resume a supressão da individualidade em nome da ordem coletiva.: “O personagem do Selvagem simboliza a recusa a esse mundo artificial, rejeitando o uso da droga soma e o consumismo, defendendo a autenticidade da experiência humana”, acentuou, ressaltando a fala é emblemática: “Eu não quero conforto. Quero Deus, quero poesia, quero o perigo real, quero liberdade, quero bondade. Quero o pecado.”

Após estabelecer conexões da obra de Huxley com várias correntes da filosofia moderna e contemporânea, abordando o pensamento de Walter Benjamin, Michel Foucault, Guy Debord, Bauman, Byung-Chul Han e Varoufakis  – e traçando um paralelo com a obra Rinoceronte, de Eugène Ionesco, Dr. César afirmou que “Huxley, Han, Bauman, Benjamin, Foucault, Varoufakis e Ionesco, cada um a seu modo, convergem para uma reflexão comum: as forças modernas – sejam o consumismo, a autoexploração, a fluidez dos vínculos, a perda da narrativa ou a vigilância – ameaçam reduzir nossa humanidade”.

Para concluir, Dr. César ressaltou: “Diante disso, resta-nos a escolha: sucumbir, como o Selvagem, ou resistir, como Bérenger. O desafio contemporâneo é usar a tecnologia, inclusive a inteligência artificial, não como instrumento de alienação, mas como meio de emancipação e preservação da experiência autêntica.”

No encerramento do encontro, a presidente do IARGS, Sulamita Santos Cabral, destacou a importância da reflexão proporcionada pelo debate. Ressaltou que obras como “Admirável Mundo Novo” provocam questionamentos profundos, fazendo um convite à reflexão sobre as experiências cotidianas, as relações humanas e o “mundo justo” que deve ser construído para todos.

Link completo do evento aqui: https://www.youtube.com/live/r9R0E1G91WQ 

Terezinha Tarcitano

Assessora de imprensa

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