21/04/2020 09h00 - Atualizado 02/08/2020 11h41

As repercussões da pandemia do novo coronavírus nas relações de trabalho

Por Terezinha
para IARGS

Artigo do Dr. Gustavo Juchem, Diretor do Departamento de Direito do Trabalho do IARGS

Tema: As repercussões da pandemia do novo coronavírus nas relações de trabalho

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As relações laborais estão sendo fortemente impactadas pela pandemia que acarretou a decretação de estado de calamidade pública. E não apenas em decorrência das medidas de prevenção e combate à transmissão do Covid-19 que, agora, devem ser aplicadas e observadas nos locais de trabalho. O necessário distanciamento social, que reduziu severamente o consumo e implicou temporariamente o fechamento de estabelecimentos e a paralisação de atividades, reduziu ou inviabilizou o trabalho, ao menos presencial, de grande número de trabalhadores. Para tentar conter os graves efeitos econômicos da crise resultante da pandemia, o Governo Federal concentrou suas ações, no campo do Direito do Trabalho, principalmente em duas medidas provisórias. 
 
A Medida Provisória 927, enquanto permanecer o estado de calamidade pública, permite que empregado e empregador celebrem acordo individual escrito a fim de garantir a manutenção do vínculo de emprego, que prevalecerá sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição da República. Permite ao empregador, de forma unilateral, alterar o regime de trabalho presencial para o de teletrabalho, antecipar a concessão de férias individuais, conceder férias coletivas e antecipar o gozo de feriados. Autoriza, ainda, a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de “regime especial de compensação de jornada”, por meio de banco de horas, estabelecido através de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até dezoito meses. 
 
A Medida Provisória 936 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, o qual prevê a possibilidade de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário e de suspensão temporária do contrato de trabalho, por acordo individual escrito ou por meio de negociação coletiva, podendo o empregado receber Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, de valor equivalente ao do seguro-desemprego, custeado pela União Federal, e ajuda compensatória mensal, de caráter indenizatório, paga pelo empregador. O empregado que tiver seu salário reduzido ou seu contrato suspenso e perceber o Benefício Emergencial terá assegurada garantia provisória de emprego. 
 
O exame das medidas acima referidas, adotadas pelo Governo Federal, evidencia a flexibilização de institutos consagrados, visando facilitar e ampliar sua utilização neste momento, mas, também e especialmente, o reconhecimento de maior autonomia da vontade ao empregado, ampliando as possibilidades de empregado e empregador livremente ajustarem, temporariamente, condições de trabalho que permitam a manutenção da relação de emprego. O objetivo da redução parcial da tutela sobre algumas instituições é alcançar maior eficácia à proteção ao direito ao trabalho. 
 
A constitucionalidade das Medidas Provisórias 927 e 936 já está sendo questionada perante o Supremo Tribunal Federal em diversas ações diretas de inconstitucionalidade. Mas, ao menos até o presente momento, o Pretório Excelso indeferiu todas as medidas cautelares solicitadas nas referidas ações, sinalizando que as medidas excepcionais previstas se justificam diante da gravidade da situação inédita que vivenciamos, e não violam direitos constitucionalmente assegurados aos trabalhadores. 
 
Muito embora certamente não tenha o Governo Federal pretendido, especialmente com a adoção da Medida Provisória 936, revalorizar os sindicatos de trabalhadores, atualmente enfraquecidos pela mudança no sistema de custeio sindical e a consequente dificuldade de financiar suas atividades, essa é uma possibilidade concreta. A ampliação do espaço para exercício do princípio da autodeterminação coletiva, mediante a inclusão dos artigos 611-A e 611-B na Consolidação das Leis do Trabalho, pela Lei nº 13.467/2017, faz com que a utilização da negociação coletiva permita às partes adotar soluções mais adequadas às suas necessidades e interesses, com maior segurança jurídica. Oportunidade ímpar para os sindicatos de trabalhadores provarem seu valor e se fortalecerem. 
 
Apesar dos esforços governamentais para reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública, teremos indubitavelmente um aumento considerável do desemprego nos próximos meses. A quantidade de dispensados, somada aos questionamentos sobre a constitucionalidade e a aplicação da legislação trabalhista relativa ao Covid-19, acarretará um incremento no número de novas ações trabalhistas. Mudanças perceptíveis serão notadas nos modos de produção e nas formas de trabalho, com destaque para o uso da tecnologia e para o crescimento do teletrabalho. O Direito do Trabalho, inobstante a recente modernização de suas regras, terá o desafio de adaptar-se a essa nova conjuntura, objetivando a manutenção de empregos, a prevenção de conflitos e o oferecimento, aos trabalhadores informais ou excluídos, de proteção legal.

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