26/04/2023 12h57 - Atualizado 26/04/2023 14h13

Artigo- Relação entre Alienação Parental e Fraude no Direito de Família e Sucessões

Por Terezinha
para IARGS
Artigo da associada do IARGS, Drª Isolda Berwanger Bohrer, formada em Administração de Empresas e Direito, com pós-graduação na área de Relações Internacionais e Comércio Exterior
Tema: Relação entre Alienação Parental e Fraude no Direito de Família e Sucessões

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A lei de alienação parental surgiu, primeiramente, para coibir graves atos de alienação psicológica contra crianças e adolescentes e, consequentemente, evitar a síndrome da alienação parental (SAP) a qual marca um fosso de afastamento e frieza entre filho(a), vítima da vontade do alienador, e o outro genitor.[1]
 
Com o tempo e o trabalho dos juristas, doutrina e jurisprudência foram expandindo o assunto, trazendo o mesmo ao universo do idoso, pois “embora a Lei de Alienação Parental faça referência à proteção à criança e ao adolescente, a doutrina atual admite sua incidência também à pessoa idosa por meio do instituto da analogia. Tal aplicação se justifica pela semelhança de tratamento dado pela lei aos idosos, crianças e adolescentes.”[2]
 
Os atos de alienação de pessoa idosa devem ser igualmente investigados como a de uma criança ou de um adolescente, inclusive com a intervenção de uma equipe multidiciplinar, pois tanto a criança e o adolescente quanto o idoso têm estatutos jurídicos semelhantes e especial atenção ao direito da convivência familiar.
 
Afeto ou afetividade são a essência de vários outros princípios constitucionais explícitos, sobretudo o maior deles, qual seja, a dignidade da pessoa humana, princípios estes umbilicalmente ligados.[3] E a dignidade da vida passa, inevitavelmente, pelos cuidados que a sociedade, a família e o Poder Judiciário devem tomar quando se trata de afastar quaisquer pessoas do convívio efetivo do idoso, que pode estar sendo vítima de atos de ativa alienação parental, uma vez que somente desse modo se estará atendendo ao princípio do melhor interesse do idoso.[4]
 
As leis de proteção ao idoso trabalhadas de forma direta ou por analogia, como é o caso da Lei de Alienação Parental[5], recentemente alterada[6], vêm auxiliando os operadores do direito no sentido de assegurar a proteção patrimonial e de manipulação de uma pessoa da terceira idade, naturalmente incapaz ou incapacitado de se autogovernar.
 
Assim está relacionada a alienação patrimonial à fraude. Ou seja, a fragilidade da pessoa idosa abre caminho ao assédio de interesse pecuniário e patrimonial que pode ser exercido por qualquer pessoa do seu convívio.
 
Por interesse próprio ou meramente por maldade, pode um parente ou um cuidador, enfermeiro, curador ou qualquer outra pessoa próxima da pessoa idosa, tentar ou conseguir isolar o idoso daquelas pessoas que lhe querem bem, podendo destruir vínculos preexistentes, especialmente se a vítima encontra-se em estado doentio. Dependendo do grau de dificuldade da pessoa idosa, pode ela ser induzida a assinar cheques, informar senhas, outorgar procurações, assinar contratos de doações e cessões de direitos, promover transferências bancárias, usar seu testamento para praticar conduta fraudulenta, na busca de vantagem pessoal econômica, financeira ou de poder de mando do alienador.
 
É igualmente comum uma pessoa idosa, ao ficar viúva, sentir-se sozinha e depressiva, tornando-se alvo fácil de terceiro que dela se acerca, oferecendo carinho e atenção, obtendo vantagens financeiras dessa aproximação, as quais logo são percebidas pelos familiares. Por conseguinte, instaura-se uma desavença direta entre os familiares e o alienador diante de seus óbvios atos abusivos de exploração do genitor, que se afasta de familiares para ficar ao lado do alienador[7], lembrando que o alienador pode ser um familiar também.
 
Descreve o artigo 3º da Lei de Alienação Parental que a prática de alienação parental fere o direito fundamental da convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar e constitui abuso moral e descumprimento dos deveres de guarda da pessoa fragilizada. O alienador poderá ser responsabilizado civil e criminalmente por seus atos.
 
O dolo do alienador é capaz, também, de alcançar o testamento induzindo a erro o testador, podendo ser o fato devidamente provado. Somente a idade avançada não é suficiente para anular um testamento. A intenção de alguém querer modificar a vontade do testador de expressar suas últimas vontades pode estar camuflada no tratar carinhoso do idoso, na proximidade física, na influência excessiva quanto às decisões do idoso, convencendo-o a rejeitar ou excluir a presença de parentes ou amigos, proibindo ou dificultando contatos, visitas e convivência familiar.
 
O mal intencionado alienador é aquele que pretende dirigir a vontade da vítima a seu favor ou de terceiros. Por meio da alienação, do afastamento ou isolamento, o vulnerável idoso é levado a acreditar que fora abandonado por um ou mais de seus familiares mais próximos. Dessa forma, em sinal de vingança, motivado por um manipulado sentimento de desilusão, pode o idoso passar a fazer a vontade do alienador, deixando prejuízo aos seus queridos que foram alienados. O alienador é o perfeito “lobo em pele de cordeiro”.
 
Lembra Claudia Gay Barbedo que as manipulações do alienador podem vir de ordens diversas, seja pela imputação falsa de crime a um dos familiares, seja pela desmoralização deles, sempre no propósito de afastar o familiar e no ímpeto de deter o total controle sobre a pessoa do ancião. Há de se dar visibilidade ao direito à convivência familiar do idoso com relação aos demais familiares, o idoso tem direito a condições de vida digna.[8]
 
Idade avançada não implica incapacidade ou deficiência. No entanto, é inegável que traz limitações de toda a ordem. Quando ocorre a interferência indevida na livre consciência da pessoa idosa, justifica-se a intervenção estatal. É necessário coibir que alguém próximo ao idoso, que exerce sobre ele algum tipo de influência, aproveite-se de sua fragilidade e passe a programá-lo para que venha a ignorar ou até mesmo odiar seus familiares.[9]
 
Têm o juiz e o Ministério Público o poder legal de defender os direitos do idoso quando impulsionados por ação de alienação parental, para impedir que o vulnerável seja objeto de manipulação de terceiro que influencia seus sentimentos e vontades criando falsa sensação de abandono dos que lhe querem bem, mas são afastados pelo alienador, especialmente em situações de ruptura familiar.

[1] STOLZE GAGLIANO, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – 10ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Pags. 603 e 604.

[2] REsp 1952107 SP (2921/0240657-4), rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. 03/06/2022.

[3] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. – 15ª ed. – Salvador: Editora JusPodivm, 2022. Pg. 67.

[4] MADALENO, Rolf; MADALENO, Ana Carolina; MADALENO, Rafael. Fraude no Direito de Família e Sucessões – 3ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2023. Pg. 280.

[5] Lei 12.318/2010.

[6] Lei 14.340/2022.

[7] MADALENO, Rolf; MADALENO, Ana Carolina; MADALENO, Rafael. Fraude no Direito de Família e Sucessões – 3ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2023. Pg. 279 e 280.

[8] Idem. Pg. 280.

[9] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. – 15ª ed. – Salvador: Editora JusPodivm, 2022. Pg. 443.

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