20/04/2021 08h42 - Atualizado 20/04/2021 08h42

Artigo- Negociação e conciliação trabalhista na audiência por vídeoconferência

Por Terezinha
para IARGS
Artigo do associado do IARGS, Dr. Jorge Alberto Araujo, Juiz Titular da 5ª Vara do Trabalho de Porto Alegre RS; autor do livro “Interrogatório Eficaz: como ter sucesso na prova testemunhal”; editor do blog Direitoetrabalho.com
Tema: Negociação e conciliação trabalhista na audiência por vídeoconferência

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Por estes dias completo um ano realizando audiências telepresenciais. Comecei a trabalhar neste formato muito mais entusiasmado pelo colega Max Carrion Brueckner, pioneiro na realização de audiências de instrução neste formato, do que acreditando na sua eficiência. Não tenho problemas em admitir que estava errado.
A nossa má vontade inicial em relação à inovação não deveria impressionar. O Direito é uma ciência antes de tudo conservadora. A transição das decisões manuscritas para as datilografadas e dos autos em papel para os eletrônicos sofreram de idêntica desconfiança. Em relação às audiências por vídeo, não haveria de ser diferente. Recordo que não é tão antiga a decisão do STF que concedeu a um perigoso traficante o “direito” de viajar de avião pelo país às custas do contribuinte simplesmente para comparecer às audiências de oitiva de testemunhas contra si, fazendo-se tábula rasa das inovações tecnológicas que lhe permitiriam acompanhá-las de forma remota.
 
O fato de iniciarmos a realização das audiências telepresenciais em estado de emergência, quando ainda não preparados para isso, foi um agravante.
 
No entanto, passado um ano inteiro nesta modalidade, podemos perceber, diante da grande quantidade de processos que tiveram fim por acordo ou sentença e as perspectivas de permanecermos ainda alguns meses, talvez ano sob pandemia declarada, nos faz ter certeza de que estamos no caminho certo.
 
Um aspecto que bastante me impressionou em relação às audiências telepresenciais é a quantidade de acordos que viemos obtendo.
 
Acredito que um dos motivos principais disso é o estado de maior atenção que a audiência por vídeo nos coloca. O psicólogo, vencedor do Prêmio Nobel de Economia, Daniel Kahnem, autor do livro “Rápido e Devagar: duas formas de pensar”, pode ter a explicação. Segundo ele, a mente humana tem duas formas de raciocinar. A primeira, mais automática, que nos permite tomar decisões rápidas, embora nem sempre acertadas; e uma segunda, que nos permite tomar decisões mais refletidas, mas que demanda mais tempo e energia.
 
Pensando de forma rápida, podemos sair correndo quando vemos um vulto semelhante a uma cobra passando, o que nos deu uma grande vantagem evolutiva, já que é muito mais eficiente nos assustarmos e fugirmos de cobras imaginárias do que parar para pensar sobre elas.
 
E uma das formas que Kahneman sugere para que despertemos o Sistema 2, ou este mecanismo de podermos raciocinar mais sobre certos fatos é, justamente, nos colocarmos em estado de atenção.
 
Parece-me não haver dúvidas de que na audiência por vídeo estamos em um estado maior de atenção, tanto que é consenso que ficamos muito mais cansados após a realização de um período de pauta inferior ao que fazíamos de forma presencial.
 
De outra parte, alguns outros aspectos devem ser considerados. Geralmente, os advogados que comparecem nas audiências por vídeo são os que têm maior conhecimento do caso, assim como os representantes da empresa. Tem sido bastante comum realizarmos as audiências com advogados situados na sede de seus escritórios e prepostos na sede da empresa no lugar de advogados correspondentes ou prepostos profissionais, geralmente designados apenas para o ato e com conhecimento e poder de decisão absolutamente inexistente ou muito limitado em razão destas circunstâncias.
 
Um outro aspecto que deve pesar substancialmente para a solução, ainda que neste caso talvez não imediata, é a própria gravação da audiência. Partes e procuradores têm à sua disposição a possibilidade de rever palavra a palavra, inclusive com a análise das expressões, o que ocorreu na audiência, em especial no que diz respeito à prova testemunhal.
 
Sabemos que o que se espera que seja dito por uma testemunha nem sempre é o que se obtém no seu depoimento, e isso pode, muitas vezes, influir não apenas naquele processo, mas em processos futuros.
 
Finalmente, há de se considerar que o conteúdo dos diálogos ocorridos em audiência estará à disposição das partes ainda que após a decisão, ou seja, as partes poderão averiguar, futuramente, diante de sua inconformidade com a decisão final, qual poderia ter sido o resultado negociado. Já fiz algumas experiências com propostas registradas em ata e cálculos de liquidação e pude perceber que as discrepâncias podem ser enormes, para ambos os lados.
 
À guisa de conclusão, em face da limitação do espaço, nos cabe refletir que as audiências por vídeo, ao lado do processo eletrônico, são uma realidade tecnológica e o progresso não dá marcha ré. Neste quadro temos o desafio de usarmos esta ferramenta da melhor forma possível. E quem o fizer de forma pioneira colherá os louros.

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