09/04/2024 07h14 - Atualizado 09/04/2024 07h14

Artigo- Explorando a Cultura Contemporânea do Uso de Tecnologias Assistivas em Crianças com Autismo

Por Terezinha
para IARGS
Artigo da associada do IARGS, Drª Evania Romanosky, graduada em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), possui pós-graduação em Direito do Consumidor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e é coordenadora da Comissão da Saúde da OAB/RS. 
Tema: Explorando a Cultura Contemporânea do Uso de Tecnologias Assistivas em Crianças com Autismo
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Este artigo investiga a incorporação de Tecnologias Assistivas (TA) no contexto educacional de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), à luz das disposições legais e dos avanços tecnológicos que promovem a inclusão e acessibilidade. As TA assumem um papel crucial na promoção da inclusão e no desenvolvimento de habilidades em crianças com TEA, impactando diretamente seus direitos à educação e à participação social.
 
A Constituição Federal de 1988, com seu princípio da educação como direito universal, serve de base para a legislação subsequente, incluindo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996), que estipula a inclusão como um direito educacional fundamental para pessoas com deficiência. Este marco legal é complementado pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), que reforça o acesso ao ensino regular para alunos com deficiência, enfatizando a necessidade do Atendimento Educacional Especializado (AEE) e o uso de tecnologias assistivas.
 
As tecnologias assistivas são definidas como quaisquer itens, equipamentos, sistemas ou serviços que ampliam, mantêm ou melhoram as capacidades funcionais de indivíduos com deficiência. No contexto do TEA, essas tecnologias podem variar desde dispositivos de comunicação alternativa até softwares educacionais adaptativos, desempenhando um papel crucial na superação de barreiras à aprendizagem e interação.
 
A atuação jurídica é fundamental na garantia do direito à educação inclusiva e ao acesso às tecnologias assistivas, demandando não apenas a aplicação da legislação existente, mas também o desenvolvimento de novas políticas que enderecem lacunas e promovam uma integração mais efetiva e abrangente das tecnologias assistivas no sistema educacional.
 
Palavras-chave: Autismo, Tecnologias Assistivas, Educação Inclusiva, Direito à Educação, Inclusão Social.
 
1. Desenvolvimento
 
1.1 A Evolução do Direito à Educação Inclusiva no Brasil:
 
A Constituição Federal de 1988 (CF) é o farol que guia nossa jornada em direção a uma educação universal, onde não há espaço para discriminação, e todas as crianças, independentemente de suas diferenças, têm o direito inalienável de aprender e crescer. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394/1996, ecoa esse chamado, definindo a educação especial como um conjunto de medidas complementares que enriquecem o panorama educacional.
 
A saúde, reconhecida como um direito humano fundamental em tratados internacionais e na Declaração Universal de Direitos Humanos, transcende a mera concepção teórica para se tornar uma pedra angular do desenvolvimento humano. No Brasil, essa visão é elevada a um patamar superior, consagrando não apenas a saúde como direito de todos, mas também como um dever do Estado. Esse compromisso é delineado pela Constituição Federal de 1988 e refinado pela Lei nº 8.142/90, que estrutura um sistema de saúde complexo e dinâmico, hierarquizado e regionalizado.
 
A integração de tecnologias assistivas no cotidiano de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) abre um horizonte repleto de possibilidades para inclusão e acessibilidade. Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (2019), estas tecnologias representam um conjunto essencial de ferramentas e serviços que promovem a autonomia e participação ativa de pessoas com deficiência. Por meio desse prisma, exploramos como a tecnologia assistiva pode ser a chave para desbloquear o potencial inexplorado desses jovens, facilitando a superação de barreiras comunicativas e sociais.
 
Este artigo se propõe a ser uma expedição teórica pelos caminhos que ligam o uso de tecnologias assistivas ao desenvolvimento de crianças com TEA, ancorado em uma análise de dados qualitativos e revisão bibliográfica. O foco é desvendar o impacto dessas tecnologias na inclusão educacional e social, apontando para práticas inovadoras que moldam novos espaços de aprendizagem e interação.
 
1.2. Revolução Inclusiva e Tecnologias Assistivas
 
1. Discussão sobre Tecnologia Assistiva:
 
Estamos à beira de uma revolução inclusiva, onde a aplicação de tecnologias assistivas não apenas apoia as necessidades individuais, mas também reconfigura o ambiente ao redor para acolher a diversidade de habilidades. É um convite à reflexão sobre como, através da tecnologia, podemos construir uma sociedade mais inclusiva e acessível a todos.
 
A tecnologia assistiva (TA) desempenha um papel crucial na educação de crianças autistas, oferecendo suporte para suas necessidades específicas e promovendo a inclusão. Mas o que exatamente compreende essa tecnologia? Não se trata apenas de dispositivos e softwares, mas de ferramentas concebidas para aumentar, manter ou melhorar as habilidades funcionais dessas crianças. Nesse contexto, a TA é mais do que um simples recurso técnico; ela representa uma abordagem holística que reconhece e valoriza a singularidade de cada criança autista.
 
O Transtorno do Espectro Autista (TEA), segundo a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), é caracterizado por uma complexa interação de dificuldades sociais, de comunicação e comportamentais. Esta condição, que se manifesta desde a infância e pode perdurar ao longo da vida, representa um desafio significativo tanto para os indivíduos afetados quanto para suas famílias e comunidades.
 
Conforme o estudo feito por Silva & Reily (2023), reconhece-se que o renomado físico Stephen Hawking, além de suas notáveis contribuições científicas, enfrentou a progressão da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença degenerativa do sistema nervoso motor. Os sistemas de Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA) utilizados por Hawking refletem o avanço tecnológico e a evolução da CSA ao longo do tempo. No entanto, o físico não chegou a utilizar o equipamento mais avançado, como o recurso de tecnologia eye tracking, disponível na década de 2000 para pessoas com deficiência (Donegan et al., 2009). Inicialmente, ele recorreu à prancha alfabética de acesso indireto como única forma de comunicação, levantando a sobrancelha para indicar a letra desejada. Posteriormente, Hawking adotou recursos computacionais de alta tecnologia que permitiam a escrita e a vocalização das palavras por meio de interfaces controladas por movimentos digitais, entre os anos de 1988 e 2007.
 
A consolidação e a expansão de políticas inclusivas não é um processo isolado. À exemplo, temos a formação de profissionais: Capacitar professores, profissionais da saúde e outros agentes sociais para lidar com as necessidades específicas de crianças com deficiência, promovendo um ambiente acolhedor e inclusivo. Mas será que essa formação é apenas sobre técnicas e procedimentos, ou também sobre cultivar uma mentalidade que valorize a diversidade e a singularidade de cada criança?
 
Essa questão nos leva a refletir sobre a essência da educação inclusiva para crianças autistas: não se trata apenas de adquirir habilidades técnicas, mas também de desenvolver uma visão aberta e sensível que reconheça a riqueza da diversidade humana. Afinal, a verdadeira inclusão vai além das adaptações físicas e curriculares; ela requer uma transformação de atitudes e percepções, que só pode ser alcançada através de uma formação holística e abrangente.
 
Assim é fundamental analisar o processo para o uso de tecnologias assistivas em um âmbito que transcenda o poder econômico, ferindo a universalidade. Neste aspecto, a legislação atual reconhece o TEA como uma forma de deficiência, garantindo direitos e acessibilidades aos afetados pela Lei nº 12.764/2012. Em 2023, o Senado aprovou a Lei 5.486/2020, introduzindo o cordão de girassol para identificar pessoas com deficiências ocultas, como o autismo. Isso visa facilitar a identificação e o suporte adequado a essas pessoas.
 
Além disso, a Lei nº 14.239/2021 determina atendimento preferencial para aqueles que utilizam o cordão de girassol, reconhecendo oficialmente o autismo e o TDAH como condições que requerem atenção especial e inclusão na sociedade. Essas leis representam avanços significativos na luta pela igualdade e na eliminação do estigma associado ao autismo e a outras deficiências ocultas. No mesmo esteio, a Lei nº 8.069/1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é um esteio na proteção dos direitos das crianças autistas, garantindo-lhes acesso integral à saúde, incluindo tratamento assistivo gratuito. O Artigo 11 do ECA consagra esse direito essencial, destacando ainda a importância da formação especializada dos profissionais de saúde.
 
Conforme podemos observar, as demandas são variadas em grau de complexidade, incluindo até mesmo questões simples, o que demonstra que as políticas de inclusão, investimento em pesquisas em novas tecnologias, acesso pelo SUS ainda exigem avanços expressivos, especialmente quando as questões incluem temas mais complexos como violência, bulling escolar, discriminação, maus tratos, falta de projetos sociais.
 
2. Construindo um Futuro Inclusivo: Políticas Públicas e o Caminho Adiante
 
A implementação de políticas públicas eficazes é fundamental para garantir o direito à educação inclusiva e ao acesso às tecnologias assistivas para crianças com TEA. Essa tarefa exige a colaboração de diferentes setores da sociedade, incluindo governo, academia, empresas e sociedade civil.
 
Exemplos de políticas públicas exitosas em outros países demonstram que é possível garantir a inclusão das pessoas com TEA. Na Finlândia, por exemplo, o governo oferece um programa de apoio abrangente que inclui educação especializada, acesso à tecnologia assistiva e serviços de apoio à família. Na Austrália, o National Disability Insurance Scheme (NDIS) garante que pessoas com deficiências tenham acesso aos recursos que necessitam para viver uma vida independente e plena. A Tecnologia Assistiva é fundamental para auxiliar indivíduos a superarem dificuldades, oferecendo suporte através de inovações tecnológicas.
 
Exemplos notáveis incluem o projeto “Andar de Novo”, que ganhou destaque na Copa do Mundo de 2014 no Brasil, e o “Equalizer”, sistema de comunicação empregado por Stephen Hawking. Essas tecnologias representam ferramentas essenciais para melhorar a qualidade de vida, possibilitando a realização de tarefas que de outra forma seriam desafiadoras. Conforme observado por Leite e Neubauer (2018), a tecnologia assistiva não apenas simplifica atividades diárias, mas também habilita as pessoas a realizá-las, marcando um progresso significativo na inclusão e acessibilidade
 
No Brasil, ainda há um longo caminho a ser percorrido. É necessário fortalecer a legislação existente, ampliar o acesso à educação inclusiva e garantir o acesso universal às tecnologias assistivas. Algumas medidas que podem ser tomadas incluem:
 
Aumentar o investimento em pesquisas e desenvolvimento de tecnologias assistivas mais acessíveis. Promover a formação de profissionais capacitados para trabalhar com crianças com TEA. Implementar campanhas de conscientização sobre o autismo e a importância da inclusão. Fortalecer a participação da sociedade civil na elaboração e monitoramento de políticas públicas.
 
A construção de um futuro mais justo e inclusivo para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um compromisso que exige o engajamento de toda a sociedade. Depende da implementação eficaz de políticas públicas que assegurem seus direitos e promovam seu pleno desenvolvimento. As soluções propostas neste estudo, fundamentadas em pesquisas científicas e dados concretos, representam apenas um passo inicial nesta longa jornada.
 
Conscientes do árduo caminho a percorrer, reconhecemos que a verdadeira inclusão vai além da mera formalização de políticas. Ela exige uma profunda transformação cultural e social, convidando-nos a refletir sobre nossos próprios preconceitos e privilégios, e a agir em prol de uma sociedade mais justa e inclusiva para todos. Essa transformação só será possível com uma mudança de cultura, com um olhar holístico que valorize a individualidade e a neurodiversidade.
 
Ao abraçarmos a inclusão como um valor fundamental, construiremos um futuro em que todas as crianças, com ou sem TEA, possam florescer e alcançar seu potencial máximo.
 
 
REFERÊNCIAS
BRASIL. CONSTITUIÇÃO (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 09 de abr. 2014.
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