08/10/2024 14h50 - Atualizado 08/10/2024 14h50

A atuação do Ministério Público nas enchentes

Por Terezinha
para IARGS

O Rio Grande do Sul é o principal corredor de entrada de fenômenos climáticos do país. Nos últimos anos, períodos de estiagem extrema vêm se alternado com enchentes cada vez mais frequentes que têm testado a perseverança e força do nosso povo. No artigo abaixo, descrevo um pouco do tema que abordei em recente palestra no Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS). Na ocasião, compartilhei com os presentes todo o trabalho realizado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul durante as últimas cheias que castigaram o Estado.

Foram dias difíceis, mas que mostraram a importância da nossa instituição junto à sociedade gaúcha. Assumimos funções que nunca imaginamos ter, atuamos em situações pouco comuns ao nosso ofício. O período foi de desafio, aprendizado, e, sobretudo, superação.

Durante todo mês de maio, e nos meses posteriores, o Ministério Público esteve junto dos gaúchos. Nós, como instituição, também sofremos com as enchentes. Tivemos a nossa sede institucional, no Bairro Praia de Belas, em Porto Alegre, inundada. Outras tantas promotorias do Interior foram destruídas pelas águas. Nas cidades onde a instituição perdeu suas sedes, continuamos trabalhando em prol da sociedade.

Um dia após a primeira inundação do Vale do Taquari, ainda em setembro de 2023, montamos uma comitiva para apoiar os promotores de Justiça da região, que já atuavam fortemente naqueles municípios nos dias que sucederam a catástrofe climática. Vivenciamos de perto a angústia de pessoas que já haviam passado por cheias arrasadoras no ano anterior. E que seguiam. Vale destacar que a experiência das enchentes de setembro e de novembro de 2023 deixou aquelas cidades mais preparadas para enfrentar este tipo de situação.

Muito se deve ao trabalho de conscientização de promotores daquela região que, junto de prefeituras e outros atores da sociedade, reforçaram a importância da prevenção em áreas mais suscetíveis aos fenômenos climáticos. O resultado: a ausência de mortos na segunda ocorrência.

O exemplo do Vale do Taquari resultou em uma importante ação do Ministério Público. Ainda em 2023, logo após a primeira cheia que arrasou cidades daquela região, criamos o Gabinete de Estudos Climáticos, o GabClima. Este importante órgão de atuação na área ambiental da instituição foi criado durante um seminário dedicado ao assunto. O Ministério Público gaúcho foi pioneiro entre seus pares no Brasil em ter um espaço dedicado exclusivamente para olhar com atenção para as mudanças climáticas e suas consequências para a humanidade.

A simbologia deste caos climático que atingiu o Rio Grande do Sul foi a inundação da Capital. Boa parte de Porto Alegre ficou debaixo d’água. Naquele mesmo dia que a água do Guaíba invadiu a área costeira da cidade tivemos de ser ágeis, já que a sede institucional do MP foi invadida pela enchente e teve de ser evacuada. Com a cheia dentro da cidade, muitas regiões ficaram sem energia elétrica. Foi o caso do prédio principal do Ministério Público, que teve todos os sistemas operacionais desligados, o que acabou impondo mais um obstáculo para nossa atuação.

Para seguirmos atuando, transferimos parte de nossa equipe para espaços na sede das Promotorias do Bairro Santana e iniciamos um dos maiores desafios desta instituição.  Atuamos no resgate de dezenas de pessoas que ficaram ilhadas na Capital. Organizamos em tempo recorde uma central de recebimento de doações no prédio da Santana, que em pouco tempo se tornou um dos principais braços logísticos para atendimento dos milhares de desalojados que perderam tudo com a enchente. Foram toneladas de alimentos, roupas e outros utensílios.

Cumprindo nossa atribuição, atuamos fortemente nos abrigos que se multiplicaram em toda Região Metropolitana: como organização de espaços, distribuição igualitária de alimentação e todo o tipo de problema que ocorre em locais com grande concentração de pessoas que vivem alguma situação de calamidade. Naquele momento, o MP também liderou a criação de um abrigo específico para mulheres. Tudo para tornar o espaço mais adequado e seguro.

O cuidado com os animais perdidos ou que viviam na rua antes da tragédia também foi uma batalha importante do Ministério Público. Zelamos pelo atendimento destes animais e agilizamos espaços específicos e adequados para os que foram encontrados.

Resolver a falta de moradias foi um problema que surgiu logo em seguida e teve a participação ativa da instituição. O problema ainda não foi resolvido, mas desde o início o MP atua para determinar locais para as novas habitações, distante de áreas de risco, e também sobre condições mínimas destas casas que estão sendo construídas para a população atingida.

Mas é fundamental destacar o nosso protagonismo na interlocução entre os agentes que atuam na reconstrução do Rio Grande do Sul. Com um olhar focado nesta importante fase para o Estado, para a nossa terra, não medimos esforços para aproximar atores de campos distintos. Fomos, em muitos casos, uma ponte importante no estreitamento da relação da sociedade com os governantes. Fizemos nossa parte, deixamos nosso legado e vivenciamos o reconhecimento do povo gaúcho pelo nosso trabalho.

Dr. Alexandre Saltz

Procurador-geral de Justiça

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