08/08/2024 07h00 - Atualizado 06/08/2024 17h54

A migração do sistema eproc para a nuvem no âmbito do Poder Judiciário gaúcho

Por Terezinha
para IARGS

Introdução
O Rio Grande do Sul foi alvo, em maio de 2024, da maior catástrofe climática de sua história, quando chuvas intensas causaram o transbordamento de rios e afetaram centenas de comunidades, deixando milhares de pessoas desabrigadas, além de causar a morte de centenas de pessoas e animais, bem como danos materiais e econômicos de grandes proporções.
Mas não foram apenas as pessoas mortas, desabrigadas ou cujas propriedades foram inundadas, que sofreram com a tragédia, pois alagamentos em sedes de órgãos e instituições públicas impuseram a suspensão ou atraso dos serviços prestados à população, reclamando a adoção de soluções rápidas e eficazes para minimizar os danos à sociedade gaúcha.
No âmbito do Poder Judiciário, a enchente foi catastrófica, pois inundou o prédio do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, onde está localizado seu datacenter principal, comprometendo também o datacenter secundário, localizado em outro prédio (Foro Central II), sendo que os geradores instalados para manter o funcionamento da “sala cofre” sofreram com o desabastecimento de óleo diesel, passando a operar em situação precária.

Nessas condições, a Administração do TJRS deparou-se com a ameaça iminente de ter que desligar o datacenter e interromper a prestação jurisdicional. Mas, ao invés disso, decidiu-se implementar a migração do sistema eproc para a nuvem, uma iniciativa que havia sido planejada para execução em seis meses, mas que foi acelerada para evitar a interrupção dos serviços judiciários.

O presente artigo aborda, de forma suscinta, o processo de migração, revelando o empenho da Justiça gaúcha para manter a jurisdição em funcionamento, apesar da tragédia.

A Computação em Nuvem e suas vantagens

A expressão Computação em Nuvem se origina do inglês, Cloud Computing e, embora pareça nova, é uma ideia que remonta ao início dos anos sessenta .

Trata-se de uma prática cada vez mais comum, permitindo que as organizações aperfeiçoem e otimizem suas operações. Embora possa parecer algo complexo, “a nuvem é uma metáfora para a Internet ou infraestrutura de comunicação entre os componentes arquiteturais, baseada em uma abstração que oculta à complexidade de infraestrutura. Cada parte desta infraestrutura é provida como um serviço e, estes são normalmente alocados em centros de dados, utilizando hardware compartilhado para computação e armazenamento” .

Em outras palavras, as pessoas e as organizações podem utilizar servidores remotos, em vez de armazenar arquivos ou rodar programas nos próprios computadores. Para utilizarem os serviços, os usuários necessitam apenas dispor de um sistema operacional, um navegador e acesso a Internet. A navegação na nuvem já é muito utilizada, embora as pessoas nem percebam, como ocorre no armazenamento de arquivos no Google Drive ou Dropbox, os quais podem ser acessados de qualquer dispositivo com internet. A navegação na nuvem também está presente nas plataformas de streaming, bem como aplicativos de viagens e hospedagens.

Uma das grandes vantagens da nuvem é o fato de que ela oferece uma forma segura de fazer backup e recuperação dos dados. Assim, a nuvem permite que pessoas e organizações possam armazenar e acessar grande quantidade de dados sem precisar possuir um computador potente.

Essa é uma das estratégias mais utilizadas por instituições públicas e privadas ao redor do mundo, como Netflix, Airbnb, GE, Bradesco, Nubank, Magazine Luiza, Ambev e Embraer, o Departamento de Defesa Americano, Agência Central de Inteligência Americana (CIA), NASA, entre outras. No Brasil, instituições como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Polícia Federal, Banco Central e Ministério da Saúde, vêm adotando essa tecnologia para otimizar suas operações.

A migração do sistema eproc para a nuvem

Graças ao empenho abnegado de servidores do Poder Judiciário e à parceria solidária de empresas como Amazon AWS, Serpro, Hitachi e outros parceiros, foi possível realizar a migração do sistema eproc para a nuvem em tempo recorde, sendo concluída em 27/05/2024, avanço tecnológico que envolveu a transferência de mais de 10 milhões de processos e 200 terabytes de dados para a nuvem.

O Conselho Nacional de Justiça tem incentivado os tribunais a adotarem soluções tecnológicas para melhorar a prestação de serviços e a transparência, com iniciativas como o Programa Justiça 4.0. Portanto, a migração realizada pelo TJRS, embora tenha ocorrido em situação extrema, não é inusitada, pois o CNJ tem promovido a adoção da nuvem em todo o sistema judiciário brasileiro.

Ao realizar a migração do sistema eproc para a nuvem, o TJRS passa a utilizar as melhores práticas de segurança cibernética disponíveis, protegendo os dados contra ameaças e acessos não autorizados, pois as grandes empresas de tecnologia que fornecem o serviço, como Amazon Web Services (AWS), Google Cloud e Microsoft Azure, investem massivamente em segurança, que inclui criptografia de ponta a ponta, monitoramento contínuo e atualizações regulares.

Para os usuários do eproc, a migração para a nuvem trará consigo ganhos em termos de estabilidade, pois a hospedagem em centros de dados robustos e descentralizados torna o sistema menos suscetível a interrupções. Em termos de acessibilidade, os processos poderão ser acessados de qualquer lugar, sendo fundamental que exista uma boa conexão à internet. Além disso, pelo fato de os dados estarem em computadores altamente potentes, haverá um desempenho superior em termos de resposta e capacidade de lidar com grandes volumes de dados e tráfego de maneira mais eficiente

Convém salientar que a migração para a nuvem não se resume à mudança de local de armazenamento dos dados, compreendendo uma verdadeira revolução da cultura tecnológica no Poder Judiciário, pois a nuvem oferece uma vasta gama de possibilidades que permitem a incorporação de novas tecnologias, como o uso da inteligência artificial, ciência de dados e protocolos avançados de segurança cibernética.

Como é natural em situações novas, a migração do sistema ainda gera dificuldades decorrentes da adaptação à nova realidade, exigindo um esforço contínuo por parte do TJRS e o apoio constante das equipes da Amazon Web Services – AWS, hospedeira do sistema na nuvem, do SERPRO, operador de intermediação contratual, e do TRF4, parceiro na modernização do eproc, a fim de manter a eficiência e a confiabilidade dessa importante ferramenta de prestação jurisdicional.

Conclusão

A catástrofe climática que assolou o Rio Grande do Sul deixou milhares de pessoas desabrigadas e causou inúmeras mortes, além de enormes estragos nas comunidades atingidas. Mas mesmo as pessoas que não sofreram diretamente com os alagamentos acabaram prejudicadas pela paralização ou pelo atraso de serviços públicos essenciais, diante dos danos ocorridos nas sedes e nos equipamentos das instituições.

No âmbito do Poder Judiciário, a inundação do datacenter principal e secundário fez com que a Administração do TJRS antecipasse a migração do sistema eproc para a nuvem, a fim de manter a continuidade da prestação jurisdicional. A rápida e eficiente atuação durante a situação de crise reafirma o compromisso do TJRS e de seus parceiros com a manutenção dos serviços judiciários, imprescindíveis à população.

A migração para a nuvem irá tornar o eproc resistente a futuros infortúnios, garantindo a continuidade da prestação jurisdicional com maior segurança, estabilidade e economia de recursos humanos e financeiros, alinhando-se às melhores práticas tecnológicas da atualidade.

David Medina da Silva

Desembargador atuante na 3a Câmara Criminal do TJRS. Ex-Promotor de Justiça do MPRS. Ex-presidente da FMP. Graduado em Direito pela UFPEL. Especialista e Mestre em Direito. Professor universitário e escritor. Associado do IARGS

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